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Gargalos no setor de construção podem afetar avanço do novo PAC

FONTE: Revista OE

Lançado em agosto pelo governo federal, o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) prevê investimentos de R$ 1,7 trilhão em obras nas áreas de transportes, energia, infraestrutura urbana, inclusão digital, saneamento, entre outras, a serem executadas nos próximos quatro anos. Apesar de conter obras mais próximas da realidade – sem os famigerados projetos “faraônicos” –, ainda assim o novo PAC pode sofrer com gargalos no setor da construção, especialmente problemas de financiamento e de ausência de mão de obra qualificada.

Em que pese a implementação do programa deva triplicar os investimentos públicos federais em infraestrutura nos próximos anos, boa parte dos aportes virá de outras fontes. Além de recursos do orçamento da União, o novo PAC contará com recursos de estatais, financiamento de bancos públicos e do setor privado, por meio de concessões e parcerias público-privadas. A fatia da iniciativa privada é estimada em cerca de R$ 612 bilhões.

Mas para dar vazão aos recursos necessários, as empresas do setor da construção precisarão obter crédito no mercado, a juros ainda bem altos, e serão obrigadas a oferecer garantias financeiras de que terão fôlego para terminar as obras. Isso em um cenário ainda desafiador, em que muitas companhias não se recuperaram da crise provocada pela pandemia, com inflação de insumos e desequilíbrios nos contratos.

“A inflação dos principais insumos desequilibrou a quase totalidade dos contratos. Concomitantemente a isso houve um ‘apagão das canetas’, graças aos órgãos de fiscalização do governo, que impediram os entes públicos de reequilibrar esses contratos”, afirma Luiz Antônio Messias, vice-presidente de Infraestrutura, Concessões e Parcerias Público-Privadas do SindusCon-SP. “Acrescento que os projetos são muito deficientes gerando enormes dificuldades e aditivos que ficaram sem soluções.”

“O setor ainda não se recuperou dos impactos causados pela pandemia”, faz coro João Jacques Viana Vaz, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Pesada no Estado de Minas Gerais (Sicepot-MG). Segundo ele, as empresas estão em dificuldades para renovar seus equipamentos pela falta de crédito e juros elevados. “Além dos aumentos exponenciais dos insumos e equipamentos, sem o devido reequilíbrio, provocando paralisações de obras e cancelamento de contratos, há também o desequilíbrio de caixa e falta de crédito”, salienta. Outro ponto de atenção apontado pelo dirigente é a ineficiência dos projetos, cujas empresas também foram afetadas pela crise.

Além da capacidade financeira, há dúvidas também sobre o operacional – dar vazão aos projetos em andamento, que voltaram a crescer, e a pressão que o novo PAC deverá fazer sobre o setor. Isso inclui, sobretudo, a falta de mão de obra qualificada. De acordo com analistas do setor, faltam desde executivos para empresas de construção e mestres de obras até carpinteiros e técnicos. “A mão de obra qualificada está migrando para outros setores, face ao achatamento nos preços tetos dos órgãos contratantes. As planilhas de preços não estão acompanhando o movimento do mercado”, frisa Vaz.

Antes da pandemia o setor já sofria os impactos da crise na área de construção pesada por causa da interrupção dos grandes projetos governamentais, na esteira da Operação Lava Jato. Isso levou as principais empreiteiras do País a diminuírem drasticamente de tamanho, demitindo dezenas de milhares de funcionários. Sem a perspectiva de novos empregos, muitos trabalhadores deixaram o setor nos últimos anos, gerando um “apagão” de profissionais especializados. “A mão de obra qualificada realmente está escassa, tanto para obras de infraestrutura como imobiliárias. As entidades, incluindo o SindusCon-SP , junto com o Senai, vem discutindo soluções e oferecendo cursos de qualificação”, salienta Messias.

A saída para resolver esses problemas já há muito foi diagnosticada pelo setor, destaca o vice-presidente do SindusCon-SP. “Passa por projetos executivos bem feitos, uma melhor análise sobre alocação dos riscos, o fatiamento de obras que forem viáveis para que mais empresas de médio porte, desde que capacitadas, possam concorrer, a contratação por preço justo, recusando preços manifestadamente inexequíveis, acesso a financiamentos, entre outros”, aponta Messias. “O novo PAC tem de observar todas essas questões, sob pena de não ter um desempenho satisfatório e até mesmo com pouca participação das empresas. Pode se repetir o que hoje observamos em muitos certames que têm sido desertos ou com baixa participação”, completa Vaz.