Papel e celulose terão R$ 67 bi em aportes

Projetos anunciados estão em execução e indústria, formada por players nacionais e estrangeiros, já está preparando um novo ciclo de investimentos

FONTE: Valor Econômico

A indústria de base florestal instalada no país anunciou investimentos de mais de R$ 67 bilhões até 2028, direcionados majoritariamente a projetos de celulose e papel, e um novo ciclo bilionário de desembolsos já está sendo gestado.

A previsão de crescimento estrutural da demanda global de celulose, assim como do consumo doméstico de embalagens e de papéis de higiene (tissue), e a competitividade do Brasil nesse mercado seguirão impulsionando o plantio de florestas e a ampliação da capacidade instalada no país, atraindo recursos de investidores locais e estrangeiros.

“Depois dos investimentos anunciados até 2028, vamos ter mais. O potencial do Brasil é enorme, porque tem os elementos-chave: produtividade, terras e ciência”, afirma o presidente executivo da Indústria Brasileira da Árvores (Ibá), Paulo Hartung, referindo-se também ao conhecimento acerca do manejo e melhoramento de florestas (silvicultura) cultivadas produzido localmente nas academia e nas empresas, ao longo de décadas.

Ex-governador e senador do Espírito Santo, Hartung diz que se estivesse à frente de um Estado, estimularia o plantio de árvores e criaria um programa de estímulo como alternativa de renda aos produtores rurais. “É sazonal, mas a renda é boa”. Hoje, o setor de base florestal planta o recorde de 1,8 milhão de árvores por dia no país.

Em 2028, último ano do ciclo de investimentos já conhecido, a Arauco planeja colocar em operação sua primeira fábrica de celulose no país. Com investimento estimado em US$ 3 bilhões, o grupo chileno poderá produzir inicialmente 2,5 milhões de toneladas por ano na unidade que será construída em Inocência (MS).

Mas seus planos para o Brasil não se encerram naquele ano. Embora o Projeto Sucuriú contemple a construção, neste momento, de uma linha de celulose, a licença prévia concedida pelo Conselho Estadual de Controle Ambiental (Ceca) ao grupo chileno compreende um total de 5 milhões de toneladas por ano, mediante investimentos de R$ 28 bilhões. A segunda linha em Inocência poderia entrar em operação já em 2032.

A Suzano, dona do maior projeto em curso atualmente, o Cerrado, também projetou a unidade que está construindo em Ribas do Rio Pardo (MS) para receber uma segunda linha no futuro. Orçado em R$ 22,2 bilhões, um dos maiores investimentos privados em curso no país, Cerrado terá capacidade de produção inicial de 2,55 milhões de toneladas por ano de celulose de eucalipto – a maior linha única do mundo – e entrará em operação até junho.

Ainda em Mato Grosso do Sul, a Eldorado Brasil tem um projeto antigo de expansão, interrompido pela disputa ferrenha e agora longeva entre as sócias J&F Investimentos, da família Batista, e a Paper Excellence, do empresário indonésio Jackson Wijaya. Os dois lados já indicaram que, encerrado o conflito, o primeiro passo será mais do que duplicar a capacidade da fábrica de Três Lagoas.

O dono da Paper reconhece a relevância do Brasil como fornecedor de fibras celulósicas para o mercado global e, apesar da frustração por causa da disputa com a sócia, almeja ampliar presença por aqui. O grupo já se reuniu com governadores de diferentes Estados, no intuito de construir uma fábrica de celulose do zero, mas a disposição de colocar novos recursos no Brasil ainda esbarra na briga societária. Na indústria, Minas Gerais tem sido apontado como um dos Estados de interesse da Paper.

A Bracell, controlada pelo gigante asiático Royal Golden Eagle (RGE), também colocou os pés no Estado do Centro-Oeste, oficialmente em busca de madeira para atender à megafábrica de celulose de Lençóis Paulista (SP). Mas a percepção, no setor, é a de que o ímpeto vai além do acesso a matéria-prima. A leitura é que a Bracell, que neste momento nega a intenção, estaria montando base florestal para ter instalações industriais no Estado futuramente.

Depois dos investimentos anunciados até 2028, vamos ter mais. O potencial do Brasil é enorme” — Paulo Hartung

É da Bracell um dos grandes investimentos do ciclo atual da indústria: R$ 5 bilhões em uma fábrica de papéis de higiene (tissue) ao lado da planta de celulose de Lençóis e em ativos de produção de químicos usados no processo produtivo da celulose.

“O jogo da celulose, nos próximos anos, ocorre muito focado em Mato Grosso do Sul”, diz o secretário estadual Jaime Verruck, cuja pasta, a Semadesc, responde por Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação. De fato, Mato Grosso do Sul deve se manter como destino dos próximos projetos de celulose, por dispor de recursos hídricos e ao menos 7 milhões de hectares com baixo teor de argila e já degradados, porque foram pastagens, que podem receber mais plantio de eucalipto. A meta é chegar a 2025 com 2 milhões de hectares plantados de eucalipto, superando Minas Gerais na liderança de área cultivada.

A costa leste do Estado, conhecida como “Vale da Celulose”, conta com infraestrutura logística que pode ser incrementada com investimentos de R$ 5 bilhões para se chegar a uma malha ferroviária consolidada, conectando-a à Malha Paulista, da Rumo, que vai até o Porto de Santos (SP). O Estado também vai investir cerca de R$ 6,5 bilhões em rodovias, um gargalo importante.

Além da oferta de água, terra e logística, outros atributos levaram produtores locais e estrangeiros a se instalar em Mato Grosso do Sul. Há uma década, o Estado entendeu que celulose poderia ser ainda mais interessante que outras commodities agrícolas, por vir acompanhada de vultosos investimentos industriais. Por isso, passou a oferecer licenciamento facilitado para a cultura do eucalipto, sem abrir mão de exigências ambientais. Hoje, 91% da base plantada no Estado tem o selo FSC (Forest Stewardship Council). Agora, conta Verruck, a meta é atrair investimentos também no elo seguinte da cadeia de valor, de beneficamento da celulose. O segmento de tissue está no radar.

Para o sócio-diretor do grupo Index, Marcelo Schmid, há outras áreas em Mato Grosso do Sul, além do eixo entre Três Lagoas e Ribas do Rio Pardo, que poderiam receber investimentos industriais. De qualquer maneira, a elevada competição por terras e madeiras exige uma nova postura dos produtores, avalia. “O setor florestal vai ter de dar um passo atrás e olhar produtividade por hectare. É mais barato olhar para o hectare que você já tem e produzir mais”, explica, referindo-se à alta recente dos preços da madeira e da terras por causa da corrida por esses ativos.

Os investimentos do ciclo atual não se resumem a celulose e tissue. Maior em papéis para embalagem e embalagens de papelão ondulado, a Klabin está concluindo um aporte de R$ 1,6 bilhão no Projeto Figueira, fábrica de papelão ondulado em Piracicaba (SP), depois de ter investido R$ 21,4 bilhões nos projetos Puma I e Puma II.